quinta-feira, 19 de fevereiro de 2015

O exílio mais exílio

Estou chocada. Como se fosse de propósito com o nome do blog. Mas sinto-me de verdade, rara, como diriam os espanhóis. Não sei bem o que fiz do meu último ano. Este ano par que foi tão raro. Talvez eu deva me contentar com os ímpares, como o do meu nascimento, e resignar-me nos pares, quietinha no meu canto, que não têm se revelado lá grandes coisas. Mas, como a gente não deve recusar nem desdenhar das dádivas que a vida traz, um ano deve ser tão bom quanto outro e encerramos essas coisas de superstição ou lá o que seja.

Sigo no exílio mais exílio. Sim, o mais deve-se ao fato de que, embora Lisboa possa ser considerada exílio, pra mim quase não é. Digamos que sobretudo nos dias de chuva e vento. Nas horas mortas em que os portugueses insistem em ficar fechados em casa. Ou quando bloqueiam a ponte Vasco da Gama para alguma corrida de domingo.

Pois. Então o que é mais exílio para uma carioca é viver no planalto central, com neves na serra e uma secura na terra que se alastra para a alma e não sai de lá.

Não, meus amigos brasileiros. Este planalto central não fica no Hemisfério Sul. Não tem vizinhança com a Chapada dos Guimarães, nem essa terra vermelha na cidade de Brasília da qual a minha amiga Monica tanto gosta. Este Planalto Central está no centro da província de Castilla-La mancha. castillalamancha, diga rápido, 'nueve meses de invierno y tres meses de infierno'. Pronto, já papagaiei o vizinho mal-humorado do outro prédio onde morava.

Ah, sim, já estou no segundo endereço no meu exílio mais exílio e ainda não sei quando e se vou voltar. Bem, que volto, volto. Amparo-me em Gonçalves Dias, dentro do seu barco, atracado em São Luis do Maranhão. 'Não permita Deus que eu morra, sem que volte para lá/ Sem que ainda aviste as palmeiras onde canta o sabiá'. Isso se os políticos das diversas cores que infestam o congresso do Planalto Central não lograrem aniquilar de tal forma a Terra de Vera Cruz que eu desista de voltar de vez.

Bem, escrever tem um caráter claramente terapeutico para mim e, como não quero que a terapia seja unilateral e se alguém ainda andar por aí passeando em blogs ao ponto de chegar a ler-me, deixo por aqui o meu caráter, seja ele bom ou mau e vou tentar me agarrar nas nesgas de sol desta tarde para voltar a uma vida que me pareça conhecida.

Deixo aqui minha visão de um indescritível pôr de sol na Avenida O'Donnel, no exílio mais exílio.